A polémica das nomeações para a Caixa Geral de Depósitos não se esgota na forma como o Governo geriu o processo nem sequer na alegada partidarização às fatias do novo órgão de gestão. Diria até que o principal problema não é nenhum destes, mas antes um outro, muito bem exposto num artigo de Nuno Garoupa a que cheguei através do Economia & Finanças: a facilidade com que em Portugal se transita directamente de um órgão regulador para uma entidade regulada e vice-versa, sem que isso represente um justificado escândalo.
A prática não é virgem. José de Matos passa agora da administração do Banco de Portugal (regulador) para a Caixa Geral de Depósitos (regulado). Antes, em 2000, Vítor Constâncio tinha transitado directamente do BPI (regulado) para governador (regulador).
Não está em causa qualquer juízo ético, de honorabilidade ou de competência para os cargos destes ou doutros responsáveis. Mas o tema tem que ser discutido frontalmente e sem melindres porque o que está em causa é suficientemente importante: a regulação de sectores importantes, cuja credibilidade é a primeira vítima da "porta giratória" a que se refere Nuno Garoupa.
Como estamos a ver, o Estado está a ficar, de forma crescente, reservado à sua função de regulador. É um resultado positivo a que chegamos da pior maneira e pelas piores razões. Se nem dessa função nobre e absolutamente crucial para o bom funcionamento da economia cuidamos com zelo e se a maltratamos de forma tão primária, restam poucas esperanças de que Portugal venha a ser nas próximas décadas um sítio bom para se estar. Dramático? Não. Há coisas com que não se pode continuar a brincar. E a regulação é uma delas.